13 de jun. de 2011

Uma introdução ao cinema sonoro


por Luiz Santiago


     O cinema nasceu mudo. Essa frase de amplo conhecimento popular, é, no entanto, uma verdade perigosa. De fato o cinema nasceu mudo, mas o espetáculo cinematográfico nunca foi silencioso. As imagens na tela não possuíam som, mas havia o acompanhamento do pianista ou da orquestra para cada filme projetado, e frequentemente, havia um comentador, cujo papel foi crucial para a definitiva “narrativização” do cinema. Com esse uso arbitrário da música e da voz, cada exibição era uma atração única.

     Com o desenvolvimento da narrativa linear e o aumento progressivo da duração dos filmes, o papel do comentador perdeu importância. A montagem e os intertítulos permitiam maior controle dos realizadores sobre o filme, sendo a música o único item do espetáculo que lhes fugia ao poder.

     Apesar de haverem algumas experiências sonoras no cinema antes de O Cantor de Jazz (1927), da Warner Bros., este é considerado o primeiro filme falado da história do cinema. A película, que apresenta gravações musicais e diálogos sobrepostos, contou com uma ampla distribuição da Warner o que tornou a novidade do som no cinema mais conhecida através da voz de Al Jolson do que das modestas experiências anteriores.


     Com o evento do som, um novo Estúdio ganhou vida, o RKO, em 1928, e uma nova realidade se apresentava para o cinema. Em 1929, uma forte propaganda acompanhou o lançamento de Melodia da Broadway, o pioneiro dos musicais, Oscar de Melhor Filme naquele ano, que ostentava o slogan de ser o primeiro filme 100% falado, cantado e dançado.

     O cinema sonoro pôs fim à carreira de diversos diretores e atores, ao passo que impulsionou a carreira de muitos outros, principalmente nos polos cinematográficos que detinham grande parte das produções sonoras: os Estúdios de Hollywood (EUA) e a UFA (Alemanha).

     Em 1928, os cineastas soviéticos Sergei Eisenstein, Vsevolod Pudovkin e Grigori Alexandrov publicaram uma declaração “sobre o futuro do cinema sonoro”, onde salientavam o perigo do uso naturalista do som dos objetos e da fala dos atores, e propunham um uso polifônico do som, apontando para o caminho da não-sincronização com as imagens, fator que, segundo os cineastas, não deixaria a peça visual como um elemento inerte, corroborado pela ilusão cada vez mais real proporcionada pelo som – o cinema deveria fazer pensar e não acomodar o pensamento.


     No Oriente, o cinema sonoro produziu fascínio na Índia, cujos filmes dançantes da era muda poderiam agora ser acompanhados por instrumentos e cantos, recursos estruturais da cinematografia hindu. Em alguns casos, o som foi rejeitado no Oriente como forma de resistência ideológica à invasão Ocidental. No Japão, a abertura à nova tecnologia foi dada nos filmes de Yasujiro Ozu, Mikio Naruse e Kenji Mizoguchi, notáveis cineastas da época. Na China dos anos 1920, o cinema encontrava uma produção mais sólida, impulsionada após a queda da monarquia em 1911, e principalmente por Chiang Kai-Chek, cujo nacionalismo deu o tom de diversas películas – embora a boa qualidade artística do cinema chinês de então estivesse nos filmes desligados dos temas políticos. Changai era então o único polo de produção de filmes na região, por isso, manteve sua conservadora linha operística pelo menos até a invasão da Manchúria em 1931, que desencadeou uma série de obras boas e pessimistas. Logo após o início da II Guerra Mundial, Hong Kong se estabeleceu como um inovador polo do cinema cantonês, já com amplo uso do som.

     No Brasil, os Ciclos Regionais não aguentaram por muito tempo a avalanche sonora de filmes estadunidenses, e o cinema nacional viu-se praticamente paralisado. Em 1930, Adhemar Gonzaga fundou a Cinédia numa tentativa de enquadrar o cinema brasileiro em um sistema de estúdio cuja base era Hollywood. Apesar do molde externo, a intenção de Gonzaga era produzir um cinema genuinamente brasileiro.

     Nos Estados Unidos, o som possibilitaria a afirmação de três grandes gêneros: o musical, o western e o filme de gângster. O musical cinematográfico é a junção de todos os elementos dos palcos da Broadway, da Ópera, do Vaudeville e do Balé. “Nascidos” nos amargos anos 1930, os musicais hollywoodianos serviam como válvula de escape para a sociedade massacrada pela Grande Depressão (1929), talvez, por ser um gênero que transita entre o sonho e a fantasia, lugares onde o mundo real e suas tragédias não podem chegar – muito mais do que qualquer outro gênero. Não nos esqueçamos que esse caráter de fuga pertence não só aos musicais, mas ao espetáculo cinematográfico como um todo. Anos depois, os musicais apresentariam temas seculares como a guerra, o assassinato, a repressão, etc.

     Como uma febre muito mais contagiosa do que seria o technicolor, o som foi um dos responsáveis por reestruturar o cinema, dando o pontapé inicial para o aumento da indústria que já ao fim da primeira década do século XX, mostrava-se forte e bem cotada.


* Esse texto foi escrito para um trabalho que apresentei na disciplina de História do Cinema a quase dois anos. Como o texto original é absurdamente muito longo, resolvi “pescar” alguns parágrafos que desse conta, mesmo que en passant, do surgimento do cinema sonoro. 

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