11 de ago. de 2010

Everyday



 por Luiz Santiago 


   As máquinas, o crescimento dos complexos industriais, e o seu nocivo efeito sobre os homens, foram os motivos que impulsionaram o surgimento da sociologia. As condições humanas no mundo pós-industrial, especialmente nas grandes metrópoles, passaram a ser objeto de estudo e preocupação: a máquina se tornara o novo meio de vida das populações citadinas. Desde o início do século XX, a tecnologia e as máquinas foram as grandes senhoras da vida urbana, e aceleraram a sociedade consumista e as diversas indústrias.

   Em 1929, um dos revolucionários da imagem das vanguardas, Hans Richter, filmou Everyday, obra na qual sintetiza a opressão do homem pelo ritmo insano das grandes cidades (lembra Metropolis de Fritz Lang), o homem submerso pelo trabalho, pela falta de lazer ou prazer pessoal, pelo ambiente-máquina que o cerca.

   O curta de 17 minutos tem o seu ritmo narrativo alterado (acelerado) conforme as sequências cotidianas são reproduzidas na tela. Tudo começa com um despertador tocando. Segue-se a rotina dos preparos matinais para o trabalho, e os componentes da metrópole: trânsito, multidão, relatórios, burocracia, prazos, ordens, números, hora do almoço, o café da tarde, a ânsia pelo fim do expediente, o cinema, a curta noite de sono, o despertador. E este ciclo dura o filme inteiro.

   Everyday alcança um ritmo tão real, que a sensação de cansaço no espectador é quase física, quando chega o final do curta. Através da montagem dialética, o cineasta disseca o humano que dá a vida pela máquia e pela burocracia do trabalho, e morre, enquanto a máquina permanecem ganhando novos formatos e funções. Alguns recursos usados por Richter para o embate entre homem e máquina foram as sobreposições e a aceleração de imagens.

   Uma atormentadora voz de um narrador off, fala o tempo inteiro em números, estatísticas, pesos e medidas, juros, lucros, cotações. 

   Até o desejo sexual é dominado pelo cansaço, e encobre qualquer possibilidade de erotização. Herbert Marcuse trabalhou esse conceito em Eros e a Civilização, onde chega à conclusão de que as avançadas civilizações capitalistas tem suas pulsões recalcadas por um princípio de realidade agravado, o que resulta na deserotização.

   Everyday lembra o ciclo da música Cotidiano, de Chico Buarque. O homem consumido pela máquina que criou. E nas lentes de Richter, isso alcança um nível ainda mais doentio e provocante.


EVERYDAY (UK, Suíça, 1929). 
Direção: Hans Richter. 
Elenco principal: Sergei Eisenstein, Michael Hankinson, Basil Wright. 



FILME ÓTIMO. É IMPERDÍVEL ASSISTI-LO!

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