15 de mar. de 2011

Natal em Julho (1940)


por Luiz Santiago

     A comédia clássica norte americana deve muito a um diretor que foi um dos maiores realizadores do seu tempo, o primeiro a escrever, dirigir e produzir seus filmes, um diretor que começou escrevendo roteiros nos anos 1930, e acabou se tornando uma das maiores estrelas de Hollywood para depois cair no esquecimento. Preston Sturges tem uma das “carreiras cadentes” mais impressionantes do cinema. De seus roteiros ou peças de teatro, 45 se tornaram filmes dirigidos por cineastas como William Wyler, Howard Hawks, Rouben Mamoulian e Raoul Walsh; dos 13 filmes que dirigiu em sua carreira ele escreveu todos, produziu oito, e já em sua estreia, levou para casa o Oscar de Melhor Roteiro Original. Sua perda de popularidade e a queda de público que teria os seus filmes estão ligadas a fatores que vão do seu perfeccionismo às mais diversas mudanças pelas quais passava o cinema dos anos 1940. Em pouco tempo, suas obras não faziam mais parte do seleto grupo de produções que falavam, tocavam e moviam o público, pois esse já direcionava olhares para outro tipo de cinema... o cinema moderno.

     Ao olharmos para a filmografia de Sturges, percebemos o quão deliciosas são suas comédias, e como, diferente dos filmes de Frank Capra, suas incursões sociais ficaram como o tempo cada vez mais nas entrelinhas. Suas comédias continuaram a explorar o roteiro – de onde vinham os elementos para as gags visuais –, em um tempo onde a imagem passava a ganhar cada vez mais espaço em detrimento da fala (já no início dos anos 1950). Hoje, nos encantamos com seus filmes pela fineza da comédia, pelo excelente roteiro e pela cuidadosa direção. No caso de Natal em Julho (1940), seu segundo filme, é a simplicidade que se sobressai dentre todas as outras coisas.


     O filme conta a história de Jimmy, que espera ganhar um concurso feito por uma grande empresa de café para o melhor slogan enviado. Com o dinheiro, ele pretende casar-se com sua noiva Betty e dar uma vida melhor para a mãe e os sogros. Uma brincadeira feita por dois colegas de trabalho com um telegrama falso, torna-se o motor da comédia que se desenrola por pouco mais de uma hora de projeção.

     A ascensão social é o que está evidente no filme. O poderoso diálogo inicial entre o casal protagonista nos mostra a competente direção de Sturges e suas ótimas sacadas para piadas, nesse caso, tirando do slogan criado por Jimmy, a sua deixa: “Se você não consegue dormir à noite, não é o café. É a cama.”. Além disso, o diretor nos expõe o desejo da juventude norte americana em relação à formação da família, casamento e posses. Jimmy é quem mais fielmente representa esse jovem burguês que tem em vista dar uma vida melhor para os seus – diferente do pai, como ressalta em uma de suas falas. O jovem então acredita que o árduo trabalho o fará “chegar lá”, a máxima falsa do capitalismo, máxima que é reproduzida indiretamente pelo gerente, durante uma conversa entre os dois. O trabalho e a imagem social também são abordados com uma acidez muito bem disfarçada pelas ótimas e simpáticas atuações de Dick Powell e Ellen Drew.


     A economia nos movimentos da câmera e a ágil e criativa forma para mudar de espaço cênico são algumas marcas desse filme. A direção é precisa, e os cenários decorados com o típico exagero de cada espaço real: a mesa do chefe cheia de papeis, a cozinha bagunçada pela manhã, a rua suburbana abarrotada de gente e muita confusão quando acontece algo com um vizinho. O consumo é a ação que fecha o ciclo de críticas do filme, com o seu clímax exatamente na rua onde Jimmy mora. Toda a confusão gerada e toda a mobilização da polícia e donos da loja para salvar o patrimônio e defender seus lucros é um exemplo de que o dinheiro e tudo o que ele possa comprar é mais importante do que ouvir e entender um trabalhador que foi enganado. Se pararmos para observar, o roteiro permanece atual.

     As reviravoltas que acontecem no final do filme não estacionam na plataforma do clichê “felizes para sempre”. A frustração e o negócio estão presentes nesses momentos finais, e embora a confusão se “resolva” em um tempo elíptico pós-filme, a dificuldade de adaptação e todo o caminho percorrido até ali retiram qualquer nota de “mais do mesmo” do filme. A delicadeza e comicidade com a qual Sturges finaliza a película só a faz mais engraçada e melhor. Natal em Julho fala de sorte, de um presente dado pelo Papai Noel do acaso, convencido de que a causa de sua insônia era a cama. Não o café.


NATAL EM JULHO (Christmas in July, EUA, 1940).
Direção: Preston Sturges
Elenco: Dick Powell, Ellen Drew, Raymond Walburn, Alexander Carr, William Demarest, Ernest Truex, Franklin Pangborn, Harry Hayden, Rod Cameron, Adrian Morris.



FILME ÓTIMO. É IMPERDÍVEL ASSISTI-LO!

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