24 de dez. de 2010

O Sol de Cada Manhã


O Sol... Por trás das nuvens

por Adriano de Oliveira


     Nicolas Cage possui o admirável dom de construir personagens convincentes. David Spritz, o protagonista de "O Sol de Cada Manhã" não é exceção. O ator, ainda que algumas vezes aqui repita uns trejeitos de Roy Waller - seu admirável papel em "Os Vigaristas" - é capaz de granjear a credibilidade da platéia com a confecção de um looser, que representa também um protótipo genuíno da crise dos 40 anos. Spritz é um comunicador de TV, mais exatamente "o homem do tempo", cargo que lhe gera uma relação de admiração e de desprezo junto ao povo em geral. Internamente, ele possui outra dicotomia. Por um lado, David representa um sujeito dotado de profissionalismo, e por isso, é bastante cotado, inclusive por outra emissora. Por outro, enfrenta um inferno, nos planos psicológico e doméstico: é subestimado pelo pai Robert (Michael Caine, com a classe que lhe é característica), um escritor renomado; tenta se reconciliar com a ex-esposa Noreen (a habituée dos filmes independentes Hope Davis), luta pela recuperação da estima de sua filha (Gemmenne de la Peña, de "Erin Brockovich") e por um caminho correto para o filho Mike (Nicholas Hoult, revelado em "Um Grande Garoto").

     Mistura de comédia de humor negro com drama psicológico, "O Sol de Cada Manhã" se mostra um filme muito interessante, não apenas pelo tom, pelo roteiro, pelas atuações. Vale, e em muito, pela bela direção de Gore Verbinski, que sabe equilibrar bem as ações e acertar o foco da narrativa. O retrato que o cineasta faz do universo que gravita em torno de Spritzer é de uma melancolia poética, a começar pela ambientação climática, por assim dizer - os dias vivenciados pelo "homem do tempo" ao longo da projeção nunca são plenamente ensolarados;                            ao contrário, são nublados e frios, remetendo ao estado de espírito do protagonista, em uma notável metáfora. Quem contribui para esse coerente panorama, introduzindo tons frios na imagística, é o fotógrafo grego Phedon Papamichael, responsável por bons trabalhos de luz como em "Identidade""Vida que Segue" e "Sideways".


      A trilha sonora de Hans Zimmer, moderna e envolvente de modo sutil, emoldura esse surpreendente filme, que mostra a busca de um homem por uma dupla redenção - consigo mesmo e com as pessoas que ama. Spritz só encontrará o rumo certo quando ouvir as palavras sábias de seu moribundo pai, que mais ecoam como um sopro divino. Sopro esse que afasta as densas nuvens para o fulgir do sol da alma e então o surgimento da luz purificadora.


 Artigo originalmente publicado no Cine Revista.


O SOL DE CADA MANHà(The Weather Man, 2005)
Direção: Gore Verbinski.
Elenco: Nicolas Cage, Michael Caine, Hope Davis, Gemmenne de la Peña, Nicholas Hoult, Michael Rispoli, Gil Bellows.


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