7 de out. de 2010

007 Quantum of Solace


Bond Briga

por Adriano de Oliveira


     Não há tempo para pensar: "007 - Quantum of Solace" (Quantum of Solace, Grã-Bretanha/EUA, 2008), novo filme do personagem James Bond, começa escanteando a assinatura da cinessérie (a famosa cena do tiro disparado pelo agente na mira focada nele) para o final da fita e já vai abrindo com uma intensa perseguição de carros numa estrada sinuosa. Está dado o recado, desta vez não haverá espaços para delineamento profundo de personagens e situações, diálogos muito espertos, grandes romances humanizadores ou jogo de cartas modorrento como no anterior, o intelectualmente mais engajado "Cassino Royale", dirigido por Martin Campbell. A veia do filme de Marc Forster é o entretenimento, efetivamente indo ao encontro da tradição da série.

     Não que "Cassino..." fosse desprovido de ação, pelo contrário inclusive. Começava também, ou ainda mais, trepidante; entanto, com suas preocupações dramáticas maiores, acabava adquirindo um ritmo irregular ao longo da sua projeção. "Quantum..." respira melhor, resgata o timing da aventura - embora canse pelo grande número de locações. São, entanto, obras mutuamente dependentes, onde a primeira termina é o começo da segunda. Logo, temos um díptico seqüencialmente ligado. Assim, os efeitos do trágico romance entre Bond (Daniel Craig) e Vesper Lynd (Eva Green) no episódio anterior assumem ser o motor do presente: 007 é agora alguém atormentado no seu íntimo por uma traição de quem amava e também um sujeito sedento por vingança após uma fatalidade. Poderia se esperar algo que não fosse um protagonista prestes a explodir?




     Em sua sanha por justiça pessoal disfarçada de dever cívico, Bond vai agindo truculenta e espalhafatosamente, eliminando fontes de investigação, até. Nesse caminho, cenas de ação física se empilham. O diretor Forster, não habituado com o gênero, manda bem, ainda que desprovido de um toque pessoal. Aqueles que esperavam uma "ação de arte" baseada no currículo prévio do realizador devem ter se decepcionado. A cartilha contemporânea do tipo é cumprida à risca, de modo que caso dissessem ser tal filme dirigido por Greengrass, Bay ou Scott, poucos duvidariam. Se a sereia do manual hollywoodiano contemporâneo persuadiu inclusive o cineasta dos aclamados dramas "A Última Ceia" e "Em Busca da Terra do Nunca", então seu canto parece ser realmente poderoso.


     Duas passagens de "Quantum of Solace" chamam a atenção por suas referências implícitas. O finalzinho da seqüência em que Craig pilota uma moto pelas ruas de Porto Príncipe alude um pouco a Steve McQueen em"Fugindo do Inferno" (preferivelmente, 007 sobre duas rodas foi bem melhor em "O Amanhã Nunca Morre"). E quando Bond se mostra um vingador pessoal e tem suas credenciais limitadas pela chefe M (Judi Dench), tal fato remonta à tônica de "Licença para Matar", título da cinessérie onde curiosamente o hoje esquecido Timothy Dalton representava, após a era de aventuras fantasiosas comandadas pelo intérprete Roger Moore, um agente mais próximo dos livros de Ian Fleming - o mesmo caso de Craig na atualidade.




     Há, sem dúvida, boas cenas de confronto - em especial, de luta - que comprovam os dotes do agente para sair no braço (e os de seu intérprete e dublês dele), mas é preciso aqui observar também outros dois pilares do universo Bond: o vilão e as bondgirls. Mathieu Amalric como Dominic Greene impressiona por sua semelhança com o jovem Roman Polanski e por seu olhar psicopata, mas não está fadado a ocupar a galeria dos inimigos memoráveis. A bela ucraniana Olga Kurylenko, que mostrou de modo mais generoso as suas suntuosas formas em "Hitman - Assassino 47" no ano passado, não marca tanto quanto a jovem inglesa Gemma Arterton. Esta, mesmo diante de pouco tempo em cena, com seus cabelos ruivos e sutil sensualidade, fica muito próxima das bondgirls clássicas de antigamente. Aliás, é com o infeliz destino da personagem de Arterton que o longa faz uma menção direta ao memorável "007 contra Goldfinger".




      Em tempo: ao optar por conservar o título original do longa ao lançá-lo no mercado brasileiro, a distribuidora acertou. Traduzir a expressão "quantum of solace", de forma livre ou literal, sem esta perder o significado original é tarefa impossível. Olhar para um cartaz intitulado "007 - Quantia de Consolação" ou "007 - Medida da Condolência" seria um convite a fugir da bilheteria do cinema. Melhor deixar como está.



Artigo originalmente publicado no Cine Revista.


007 - QUANTUM OF SOLACE (Quantum of Solace, Grã-Bretanha/EUA, 2008).
Direção: Marc Forster.
Elenco: Daniel Craig, Olga Kurylenko, Mathieu Amalric, Judi Dench, Gemma Arterton, Jeffrey Wright, Giancarlo Giannini, Tim Pigott-Smith, Joaquín Cosio.


FILME BOM. RECOMENDAMOS ASSISTIR.

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