OU
STALLONE E CIA.
por Adriano Oliveira
Coordenador do site Cine Revista e Crítico de cinema (ACCIRS)
"Os Mercenários" estreou timidamente no Brasil, talvez minado pela anti-propaganda que infligiu a si próprio. As declarações infelizes de seu diretor e protagonista, Sylvester Stallone, a respeito do Brasil - onde gravou boa parte de seu longa - parecem ter contribuído para que a obra fosse lançada em um reduzido número de cópias (em Porto Alegre, apenas quatro, sendo uma dublada), a despeito do blockbuster que pretende ser.
Também "Os Mercenários", o filme, não se ajuda. Um dos problemas dele é justamente o excesso de caras conhecidas em cena, e nenhuma delas com um significativo frescor de novidade. Stallone juntou seus amigos e confrades de estilo para criar algo que se encontra mais próximo dos "filmes de figuração" do passado, onde juntar o máximo de nomes apregoados do público era muitas vezes receita de sucesso (vide "Inferno na Torre" , a série "Aeroporto" e mais recentemente os longas da turma de astros de "Onze Homens e Um Segredo" e suas continuações), do que um representativo exemplar de ação. Todos dão o ar da graça, mas pouco contribuem para manter o interesse na trama além da participação em si, como se somente dar as caras fosse suficiente: roteiro e atuações foram colocados em segundo, terceiro, quarto... ad infinitum planos. O mais incrível é que o soldado da fortuna travestido de psicopata (e vice-versa) interpretado por Dolph Lundgren e o vilão inescrupuloso vivido por um envelhecido Eric Roberts são os que convencem melhor, apoiados muito mais pelo physique du rôle que possuem do que por qualquer outro talento. E torna-se decepcionante observar Mickey Rourke sem empunhar uma arma ou sair no braço e pior, com "lampejos" do caricatural personagem que representou no igualmente desapontador "Homem de Ferro 2" .
O filme já nasce datado, com cara e DNA de action-movie dos anos 80, e parece querer achar sua razão quase somente disso, sem injetar algum elemento novo. Na contracorrente disso, basta lembrar que dois exemplares recentes de ação à moda oitentista acharam seu nicho justamente por se renovarem: "Busca Implacável" mostrava um Liam Neeson - cara nova no terreno - encarnando o espírito dos personagens de Charles Bronson e "Rambo IV" , dirigido pelo próprio Stallone, se reinventou no uso da ultraviolência (que em "Os Mercenários" apenas soa como um déjà-vu). A preguicite andou contaminando outras camadas do filme. Ao ambientar noturnamente a sequência final (curiosamente, a inicial também é assim), o longa dá margem para cobrir seus próprios defeitos cinematográficos em coreografia de lutas, montagem (péssima!) e direção de arte.
Para tentar salvar a pátria, há alguma ação de qualidade visível, uns poucos bons planos, como aquele do tiroteio de ponta-cabeça que o diretor/ator orquestra, e uma cena realmente memorável que é a melhor coisa do filme. Esta se passa no interior de uma igreja, confrontando Stallone, Bruce Willis e Arnold Schwarzenegger, onde o limite entre a ficção e realidade envolvendo os personagens e seus intérpretes é ultrapassado diversas vezes, com isso gerando piadas praticamente a cada frase proferida por eles.
Mas isso se mostra reduzido para a ambição do longa, que ao extremo da projeção acaba capengando na própria falta de educação que Sly imprimiu aos créditos últimos. Não fosse uma citação obrigatória à unidade brasileira de produção, um espectador estrangeiro nem saberia que um bocado do filme foi gravado no Brasil; entanto o pior é que na lista de agradecimentos não há um sequer a qualquer coisa que lembre nosso país, nem mesmo a Mangaratiba (RJ), principal locação do longa, local onde o ator almeja uma estátua. Ainda que devamos separar a pessoa do artista - e isso sempre é preciso -, fica aqui algo que jamais poderia ocorrer: o mesmo tipo de ranço causado pela resposta de Charles Bronson ao ser entrevistado por uma emissora de TV brasileira na década de 90: - "Brazil? What is Brazil?".
Artigo originalmente publicado no Cine Revista.