por Luiz Santiago
O cinema de Aleksandr Sokúrov é puro sonho, arte e poesia. Suas obras transitam entre o escrupuloso visual e a captação da identidade russa através de ângulos praticamente impossíveis, em filmes definitivamente transformadores. Dentre os temas recorrentes na filmografia do diretor, encontramos a guerra, o sonho, a morte e as relações familiares – além, claro, da abordagem histórica, mnemônica e cronológica (tendo nesse aspecto uma particular tendência a mostrar a passagem do tempo na tela).

No entanto, em meio a esse mundo onírico pontuado pela guerra, uma segunda fuga se revela, e talvez insinue a morte, a alma, o sentido artístico e humano do soldado fora do estado de vigília. A aparição do anjo em um quadro do filme, é inquestionavelmente uma representação cifrada do inconsciente, mas seu significado pleno nos escapa. O filme cerca o indivíduo em seu território de guerra, mas não nos dá pistas sobre sua personalidade ou vida fora daquele espaço. O curta fecha-se no sonho, plasma o momento em que um combatente é substituído por outra realidade que não a de sobrevivência.
Como em quase todos os filmes dirigidos por Sokúrov, é difícil descrever exatamente a atmosfera e a sensação que a obra causa no espectador. A sensibilidade e a poesia misturam-se às críticas indicações da realidade, nossa percepção do mundo onírico e da guerra são reformuladas, e parece que todas as questões existencialistas saltam das nuvens da última cena para o nosso pensamento. Ao terminar o filme, pouco se sabe dizer a respeito. O que fica na mente do espectador é o conjunto de imagens-enigma expostas durante os doze minutos de projeção.
O SONHO DO SOLDADO (Soldatskiy Son, Rússia, 1995)
Direção: Aleksandr Sokúrov
Elenco: Soldados russos